Diversos recursos econômicos do Brasil foram apresentados, cada um à sua época, como o caminho para o progresso nacional e a emancipação pessoal dos brasileiros: o açúcar, o ouro, o café, a borracha, a indústria. Em todos esse momentos, o futuro do País foi prometido como o resultado de uma atividade econômica central. Agora surgiu o pré-sal.
O açúcar gerou riqueza, mas não emancipou o povo do Nordeste, nem deixou o país mais civilizado. O ouro serviu mais para embelezar Portugal e enriquecer a Inglaterra do que para desenvolver o Brasil. A industrialização fez do Brasil uma potência econômica, mas ao custo de uma sociedade campeã em violência e desigualdade.
Com o pré-sal não será diferente. Depois de gastar centenas de bilhões, aproveitando toda a reserva a um preço satisfatório do petróleo, o resultado final será igual ao dos anteriores. Terá apenas duas diferenças: o custo financeiro será muito maior, sacrificando o presente; e os impactos ecológicos muito maiores, sacrificando o futuro. Como o ouro acabou, o petróleo do pré-sal acabará. Ou será substituído, como foi a borracha.
Outra vez, prisioneiro da economia baseada em recursos naturais, o Brasil não percebe que a saída está em se transformar em produtor de conhecimento: ciência, tecnologia, cultura. O único recurso capaz de superar dificuldades, substituir obsolescências e dinamizar a economia é o conhecimento: capaz de explorar o pré-sal, e mais – de inventar substitutos para o petróleo.
E para ter ciência e tecnologia, é preciso investir na pré-escola de todas as crianças. Por isso, no longo prazo, a pré-escola é mais importante do que o pré-sal.
Lamentavelmente, essa não é visão da nossa sociedade. Um clássico da literatura de esquerda diz que o subdesenvolvimento da América Latina foi provocado pelas “veias abertas” que provocaram a sangria dos recursos naturais de nosso continente. Na verdade, o atraso decorre do abandono da educação de nossas populações e a resultante impossibilidade de construir uma forte infra-estrutura científica e tecnológica. Mais do que as “veias abertas”, foi o “abandono dos cérebros” que atrasou o continente. Se, ao longo dos séculos, o Brasil tivesse perdido seu patrimônio natural mas investido na educação de seu povo, hoje, na época da economia do conhecimento, estaríamos na linha de frente do desenvolvimento econômico.
Finalmente, diversos projetos têm surgido visando à vinculação dos royalties do petróleo com investimentos na educação. O presidente da República também de apropriou da ideia de que parte dos recursos do pré-sal seja canalizada para financiar a educação. No entanto, o risco é que, de novo, os investimentos na educação sejam adiados para um futuro distante. E quando o pré-sal começar a dar resultado, o Brasil tenha perdido mais uma geração e o pré-sal se torne outra ilusão, adiando a revolução de que o Brasil tanto precisa. Além disso, de pouco servirá investir em educação daqui a alguns anos se, até lá, não tivermos cuidado das crianças que estão em idade pré-escolar hoje.
O Brasil não pode nem precisa esperar o pré-sal para investir nas suas crianças. Não pode porque o futuro estará na economia do conhecimento, não na exportação petrolífera. Não precisa, porque já dispõe dos recursos necessários. Vincular a revolução educacional à hipotética e futura exploração da reserva do pré-sal é um suicídio nacional.
“Adotar” todas as crianças em idade pré-escolar – com tudo o que for preciso para iniciar o desenvolvimento intelectual das futuras gerações – custará, no máximo, R$15,5 bilhões por ano, o equivalente 1% do que será gasto com o PAC, o pré-sal, a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, caso o Rio de Janeiro seja a cidade escolhida. Mas para fazer o PAC, a Copa e as Olimpíadas, ninguém propõe esperar o pré-sal.
A pré-escola é mais importante, construtiva, viável, ética, barata e sustentável do que o pré-sal. Entre pré-escola e pré-sal, três letras a mais fazem uma radical diferença no futuro do País.
Cristovam Buarque (PDT-DF) é senador
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